terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Sem cartas na cartola

Ace of Spades foi o primeiro álbum clássico de rock que eu escutei por inteiro. A faixa título, mais Love me like a reptile, We are the Road Crew, Dance e Jailbait tocaram por horas seguidas no meu antigo Aiwa.

Na época, pegava os CDs numa locadora, que hoje não existe mais. Assim, para não “perder o som”, gravei o cd numa fita K7, que hoje também não existe mais.

Com o passar dos anos, a figura do baixista Lemmy Kilmister tornou-se mítica, para mim e todos os outros que o acompanhavam. Falas absurdas, músicas altíssimas, baixo destacado, infindáveis histórias e estórias acerca de sua pessoa, enfim.

Nunca pude ir a um show do Motorhead; problemas de verba, saúde e distância estão na lista de desencontros. No entanto, vejo que agora não irei mesmo, pois acabo de ler sobre a morte de Lemmy. O ex-Hawkind, eterno Motor”rock”head.

Sem lamentos, de forma alguma. Creio que o músico tenha vivido exatamente da maneira que sempre quis, de road de Hendrix à líder de umas das mais carismáticas e fiéis bandas do rock´n´roll.

“How are you gonna live now
Out in the lonely fields
What do you have to give now

I wonder how do you feel”

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Trono e coroa?

Dificilmente exista alguém que delimite tanto uma banda de pop ou rock do que seu vocalista. Ano após ano nos deparamos com inúmeras discussões sobre o assunto e as tais formações A ou B. Bom, eu não fico em cima do muro, e costumo me posicionar sobre o assunto.

Para apimentar o papo, sai agora no Brasil, pela Gutenberg, Os Young, os irmãos que criaram o AC/DC. A estória deixa um pouco de lado a banda em si e foca mais em seu núcleo: Malcon, George e Angus Young.

Claro que isso não apresenta nada de acordo com o que falei sobre os vocalistas de bandas, no entanto, Jesse Fink, o autor do livro, deixa clara a sua opinião: “Bon Scott foi o melhor vocalista do AC/DC e suas letras não podem ser comparadas às atuais. Seu vocal era muito superior ao de Johnson. Ele era incomparável ao vivo. Os discos que ele fez com AC/DC nos anos 70 são os melhores do grupo, embora eu ame o Back in Black. Não sou fã do Brian Johnson e não me desculpo por isso".

Dentre tantos grupos que passaram por mudança de cantores, alguns carregam certa injustiça, com todos os que passaram pelo posto. Neste grupo, podemos colocar o Judas Priest, Journey, Black Sabbath e, claro, AC/DC, entre outros.

Quanto aos australianos, a injustiça esbarra em vários pontos. Um deles é sobre o tempo que Brian Johnson ocupa o posto de vocalista, já são 35 anos!, o suficiente para que tenha uma respeitável relevância na banda. Também acumula 10 discos gravados com o AC/DC e mais de 200 milhões de discos vendidos.

Bom, isso para por aqui. Do lado de Bon Scott, os números são mais modestos, com seis discos, nem 50 milhões de cópias vendidas, um respeitável currículo de confusões, overdoses e bebedeiras, esta ocasionando sua morte, em 1979.

O grande problema é que Bon Scott era daqueles caras carismáticos no palco, com grande presença e entrega incendiária, nos moldes de Angus, ou mais.

Como disse no início, não fico sobre o muro, então digo e corroboro com Fink: Bon foi realmente a voz do grupo australiano, depois eles se firmaram como um grupo coeso e profissional, mas com menos Alta Voltagem.  

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Um poeta que sobe

É difícil mensurar o tamanho de qualquer sentimento. Seja ódio ou dor, paixão ou desalento. No fim das contas, tudo o que sobra não dá conta de nada disso.

O estimado Cazuza costumava dizer coisas muito inteligentes, mas hoje eu só fico com seus heróis, ou os meus. Não morreram de overdose, mas, qual a diferença?, também morreram. E continuarão a morrer, pois é assim que a vida segue, usando da morte como seu adubo, a sua sonda, o sêmen que se espalha nessa constelação, talvez finita, de talentosas vidas virtuosas.

Esta noite adormece, senão mais escura, ao menos mais triste do que as últimas. A sentinela fará o seu papel de velar pelo irmão que se vai, irmão o qual alguns chamavam amigo, outros amor, outros você, outros chamavam moço ou coisa assim.

Nunca conversei com Fernando Brant, mas sinto que ele papeou comigo por ao menos uns quinze e ininterruptos anos. Pois assim são os poetas, conversam conosco mesmo sem nos conhecerem, mesmo reclusos, e dessa forma seguem após suas partidas, seus encontros e..., enfim.

Falando em poeta, Drummond tem em um de seus livros um dos maiores títulos que alguém possa sequer alcançar: sentimento do mundo. Agora eu me pergunto: quando alguém morre, que é esse sentimento?


Agora, nesta noite de pouco brilho, o céu recebeu não uma estrela, mas um planeta. Vá, Fernando Brant, as esquinas do mundo já não bastavam a você.  

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Mundo vago

Não quero aqui falar da morte e de sua consequência, que na verdade nada mais é do que um ciclo redundante. A verdade é que a dona não gosta de escolher, e tal qual um funcionário exemplar, faz o que deve ser feito, o que lhe é incumbido, sem distinguir entre essa é ou não a minha função.
Também fica claro de que a morte é dona de nossa única verdade inata, aquela a qual carregamos como a pedra de Sísifo, sem vitória, sem alcançar o topo.
São os velhos as pessoas mais queridas pela morte, mas isso soa como algo ofensivo e prontamente mentiroso. Leva de caminhão uma centena, pois todos somos iguais perante ela.
No entanto, creio que ultimamente a morte esteja fraca, vazia de literatura, pois desde o último ano, ou um pouco mais, tem levado todos aqueles homens que deram a vida pela palavra, e terminaram seus dias como uma palavra: FULANO DE TAL, DATA, descanse em paz.
Em 2012 foi Autran Dourado, ano passado tivemos Ivan Junqueira, Rubem Alves, Ariano Suassuna e João Ubaldo Ribeiro. E hoje pela manhã, não contente com tamanha companhia, ela decidiu levar dois de uma vez: o uruguaio Eduardo Galeano e o alemão Gunter Grass.
Destes, considero a perda de Galeno como um rombo, uma veia implodida, estraçalhada nesta América mundial. Esse homem escreveu tudo com uma paixão incomum. Criticando, apontando, deleitando ou apenas se apaixonando, tudo com o mesmo peso e teor. Seu livro De pernas pro ar deveria ser distribuído pelas escolas do mundo, assim como Memórias do Fogo. Sim, também Futebol ao sol e à sombra, mas este aos boleiros que trocaram o brilho dos olhos pelo das moedas. Não cito sua obra mais conhecida por total falta de necessidade, ela já virou monumento, criou vida própria.
Escritores são como obras de arte, pertencem ao mundo, acasalam suas canetas com os cadernos de lugares todos, e entregam seus filhos sem remorso, apenas esperando que, se não fizerem boas coisas, ao menos tenham uma vivência digna, sem se furtarem ao dever de manterem-se vivos, falantes.
Hoje o mundo não amanheceu mais triste, apenas um pouco mudo, mas é passageiro. Tocam os tambores e segue o sol.


quarta-feira, 1 de abril de 2015

A sensibilidade desumana.

Parem tudo, corram para suas casas, se escondam, não deem as caras. O Brasil está tomado por menores violentos e insanos, seres que não merecem sequer um olhar, muito menos enviesado. Não passe perto das creches e parquinhos pela cidade, pode ser fuzilado por uma criança que carrega uma bazuca na fralda, napalm no copo de leite, sabre na mochilinha.
Sei que haverá uma voz gritando: mas são apenas crianças!!! Sim, eu responderei. Mas são mesmo crianças que estão sendo condenadas por um sistema sedento em dar respostas, e omisso em procurar soluções. Outros dirão que existem crianças ruins e crianças boas. Que enquanto uma mata, outra é vítima. Uns dirão isso e aquilo, outros aquilo e isso.
O fim desse papo todo é que existe uma parcela da sociedade firme num discurso que diz assim: lugar de gente ruim é na vala, sem direito a nada, nem mesmo ao pensamento. O incrível é que essa mesma sociedade é corruptora dessa infância. É a sociedade que propaga a falta de valores, o apego ao supérfluo, o fim das relações humanas.
Quando alguém planta uma semente do mal numa criança, torna-se tão vil quanto o delinquente a quem tanto ele combate.  
Quando li o romance Cidade de Deus, do carioca Paulo Lins, o que me prendeu na trama foi a humanização dos personagens, principalmente Dadinho e Bene. Embora a violência não seja algo endêmico, segundo alguns críticos da sociedade na qual vivemos querem nos provar o contrário, o atordoante cenário de guerra “cinematizado” pela mídia age como escopo de uma parcela presa aos dogmas da boa família cristã e brasileira.
A pergunta que lambe o chão dos bares, bancos e demais estabelecimentos é: como alguém que mata, rouba e estupra pode ser inocente, pode ser bom? Como alguém tão violento pode ter direitos, como a uma cela imunda e um colchão aos farrapos? Dessa forma, é difícil imaginar que alguém em posse de uma arma possa ser uma pessoa de bom caráter ou índole.
Para responder a essas perguntas, eu preciso voltar ao trecho sobre Paulo Lins, quando disse que a humanização dos personagens foi o que de mais marcante eu li na obra do escritor brasileiro. E vou mais além, lembrando do Corleone de Puzzo, do Rino Zena de Ammaniti, do Pinkie Brown de Greene ou mesmo do Bathgate de Doctorow, todos estes personagens, contraventores, sociopatas, bandidos, todos foram dramaticamente humanizados. Aqui eu abro um parêntese, e pergunto: foram eles humanizados ou são tão reais porque são humanos? Sim, humanos, errantes, donos ou vítimas de suas vidas e escolhas.
Não me parece comum alguém enxergar um ato violento por mais de um ângulo que não seja o da brutalidade, seguido pela ira e acabando na intolerância. Temos, sim, milhões de atos sangrentos, burros e impensados, praticados por pessoas das mais variadas classes e posições sociais. Os ricos, os paupérrimos e os vazios. No entanto, faz-se necessário uma indagação sobre a violência. Uns a enxergam como ato físico, outros morais ou psicológicos, nada de novo. Mas é preciso pensar mais profundamente sobre o ato violento. Quando tiramos o sonho, a vontade, a dúvida, a autonomia, a infância, a inocência, a coragem ou o medo de alguém e os estratificamos como simples manobra de criação, também aí somos violentos, tão brutais quanto aqueles que levantam as armas brancas, as vozes e punhos, cuspindo suas verdades permanentes e solidas como a perene ignorância.
Sendo assim, a recente, e crescente, tentativa de diminuição da maioridade penal no Brasil mostra como uma nação pega tudo aquilo pelo que lutou e coloca num caldeirão onde tudo se mistura: futebol, política, infância, raça, perseverança, direita, esquerda, meio, lado, margem. O resultado é uma sopa insossa e intragável.
 A sociedade é quem cria os seus Dadinhos, Corleones e Bathgates da vida, é a sociedade quem esbofeteia os rostos e cobra uma postura sobre os hematomas. E aqui coloco a sociedade como um todo, não dividindo-a em política e povo. Dessa forma, cada um precisa saber a sua real parcela de culpa na formação deste indivíduo que hoje está sendo tachado pela simples pecha de DiMenor.  
Como disse Durkheim: “não podemos, nem devemos nos dedicar, todos, ao mesmo gênero de vida: temos, segundo nossas aptidões, diferentes funções a preencher, e será nisso que nos coloquemos em harmonia com o trabalho que nos incumbe. Nem todos fomos feitos para refletir; será preciso que haja sempre homens de sensibilidade e homens de ação.”

Mas uma coisa se choca contra as palavras do filosofo francês: se é preciso homens de ação e homens de sensibilidade, infelizmente contamos apenas com a não sensibilidade e com uma ação desmesuradamente covarde, insensata e pétrea. Pétrea como a cláusula que a Comissão de Constituição e Justiça que atropelar para punir o jovem e sua não juventude.  

sábado, 28 de março de 2015

A culpa de ser uma lenda

Acompanhei atentamente ao show de Robert Plant, infelizmente pela TV, que o inglês apresentou hoje aos brasileiros, no festival Lollapalooza. Fato é que venho assistindo às suas apresentações ao longo da turnê, coisa que o youtube, felizmente, permite maravilhosamente.

Quando um artista tem mais de 50 anos de palco e integrou um dos mais contundentes grupos de rock da história, fica difícil contemplar um set suficientemente satisfatório ao publico. Dessa forma, Plant mescla Led com África e carreira solo, mais Willie Dixon e Bukka White, tudo alinhavado com uma classe sobrenatural. 

Após o show, li algumas matérias a respeito do concerto, as quais me incomodaram sobremaneira. Em uma delas, o repórter diz que o excesso de misturas introduzidas por Plant durante o show deixam o ambiente morno; já outra reclama da potência vocal do cantor. Oras, penso comigo, essa mistura funcionou em “todos” os shows da turnê. O senhor vem de uma sequência de concertos e festivias onde desfila pedradas como Tin Pay Valley, Turn it up, Bron-Y-Aur Stomp, Communication Breakdown, e onde jamais deixa a chamar se apagar. Como pode manter a voz cristalina?

Bom, a verdade é que você pode admirar vários Plants. O gritador afinado dos anos 60 ou o homem com 20 pulmões dos anos 70. Também pode escolher entre o senhor empetecado dos anos 80 ou o pacato dos anos 90. Pode ainda se decidir entre o homem que renasceu neste século, ou então o cantor dos Honeydrippers, a lenda que voltou com o Led, que flertou com o country (bobagem, posto que ele sempre usou e abusou do estilo), enfim.

O que parece é que hoje, beirando as sete décadas, Plant é um cantor pleno e maduro, sabedor de seus limites, conhecedor de seu potencial e absolutamente completo, como Sinatra, Bennett ou Aznavour. Justiça seja feita, alguns jornais corroboraram minhas ideias.

Nobody's fault but mine


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